Uma mãe relata que foi impedida de entrar com uma doula no Amparo Maternal, maternidade localizada em São Paulo, mesmo existindo uma lei municipal que libera a entrada dessas profissionais em todas as unidades públicas de saúde.
A mãe Fernanda (nome fictício), que pede para não ser identificada, teve seu primeiro filho na unidade de saúde no dia 1º de abril. Nessa data já havia encerrado o prazo de 90 dias concedido às instituições para se adaptarem a nova legislação. A lei foi sancionada em dezembro pelo prefeito Fernando Haddad (PT).
Como não tem plano de saúde nem condições financeiras para arcar com uma equipe de parto humanizado, ela optou em buscar o Amparo na expectativa de ter um parto normal, sem intervenções. “Pretendia ter meu bebê na casa de parto, mas com 37 semanas descobri que estava com estreptococo B positivo e isso impede o parto lá”, conta a mãe.
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Ela diz que no Amparo Maternal esperava ter uma doula voluntária, mas como não tinha optou em trazer uma doula contratada de fora. “Eles proibiram a entrada da doula pois alegaram que ela não tinha feito o curso lá e que era preciso ter um número de horas de estágio lá no Amparo”, relata a mãe.
A parturiente diz que uma semana antes do parto o marido foi até a unidade de saúde para obter informações sobre a entrada da doula. “Meu marido perguntou como poderíamos encontrar uma doula que cumprisse esses requisitos e nesse momento ela desconversou e disse que não seria necessário porque todos os dias tem doula voluntária e que a equipe médica e de enfermagem estava muito bem preparada para conduzir um parto normal, mas como pari em um sábado não tinha nenhuma doula voluntária”, relata.
A gestante diz ainda que a mesma funcionária disse que quem faz o parto é a mulher e que o acompanhante supre o papel da doula. “Achei bem estranho porque estavam nos desestimulando a ter uma doula. Acreditei que teria uma doula voluntária e que a equipe seria bem preparada, mas não foi assim”, relata.
No dia do seu parto, Fernanda conta que viu uma gestante entrando na unidade de saúde em trabalho de parto com o marido e com uma doula, mas não permitiram que os dois entrassem. “Ela teve que optar por um.Eu ouvi alguns profissionais indignados porque a gestante estava insistindo na entrada da doula. Ouvi eles dizendo ser um absurdo entrar uma pessoa de fora que interferisse no trabalho deles. Estavam bem bravos”, relata.
Fernanda relata que não recomenda a unidade de saúde para outras gestantes. Ela conta que chegou com bolsa rota, com quatro centímetros de dilatação e contrações de cinco em cinco minutos. “Nesse momento a médica já queria entrar com o ‘sorinho’ sem me perguntar. Eu disse que não queria e ela de forma nada acolhedora disse “Ok”.Minha primeira pergunta foi se tinha doula e disseram que não, porque era sábado”, diz a gestante. Ela conta que a maior parte do trabalho de parto ficou só ela e o marido e que ele tentava fazer o papel de doula, mas sem saber ao certo como ajudá-la.
A paciente diz ainda que os profissionais de saúde não davam qualquer orientação. “Fui para o chuveiro e para bola, mas tinha que ser no tempo que eles definiam. Eles só aparecem para falar ‘agora vá para o chuveiro por no mínimo 40 min, mesmo que seja ruim fique lá para fazer efeito”. Não perguntavam o que eu queria. A pior parte foi quando cheguei em 7 cm e o médico veio me ameaçar que se eu não colocasse a ocitocina iria pra cesárea em uma hora. Eu disse “ok” (sabia que a bebê estava descendo e que estava tudo bem!), se precisar eu vou pra cesárea então”, relata.
Fernanda conta que isso ocorreu ‘coincidentemente’ perto da troca de plantão. “Enfim apareceu um enfermeiro obstetra que decidiu me acalmar, orientar e ajudar. Ele conversou sobre como eu deveria agir quando viesse a dor para que a minha bebê nascesse. Eu me agarrei nas palavras dele, me concentrei o meu corpo e em uma hora minha bebê nasceu. Com essa experiência eu me dei conta do quanto é importante durante o trabalho de parto que alguém te acolha, te compreenda, te oriente, te apoie, fale coisas positivas. Fiquei pensando como teria sofrido menos se tivesse tido uma doula.”
Ela relata ainda que a unidade de saúde não tem condições de receber a mãe com acompanhente. “Apesar de permitirem um acompanhante é impossível ficar duas mulheres, dois bebês e dois acompanhantes no quarto de forma digna. Não tem espaço suficiente. Vi muitas mulheres que acabavam abrindo mão do acompanhante e ficavam sozinhas.Meu marido ficou dormindo numa cadeira de plástico”, comenta.
OUTRO LADO
O Amparo Maternal diz que cumpre rigorosamente a legislação vigente e que permite a entrada de doulas desde que “estejam previamente cadastradas e atendam os requisitos de qualidade e segurança estabelecidos pela Instituição.”
O Amparo Maternal diz que reavaliou seus requisitos para o ingresso de doulas externas. As doulas interessadas em acompanhar parturientes no Amparo Maternal devem atender aos seguintes critérios: preencher ficha cadastral, apresentar foto 3×4, cópia do RG e CPF, cópia da carteira de vacinação atualizada comprovando imunização de Hepatite B, Tríplice Adulta e Varicela ou sorologia. A documentação deve ser encaminhada para o e-mail doulas@amparomaternal.org. Os documentos serão analisados e, no prazo de cinco dias úteis, a doula receberá orientação para realizar integração na maternidade e conhecer fluxos e procedimentos assistenciais adotados pelo Hospital.
O curso oferecido para formação de doulas, diz a instituição é para “promover capacitação e multiplicar conhecimento”. O valor cobrado, que não foi divulgado, é exigido apenas das doulas que aderem ao sistema de voluntariado do hospital. “Entendemos que esses requisitos são importantes para proporcionar segurança às parturientes e assegurar que o serviço prestado esteja de acordo com os melhores protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas”.
A instituição ressalta ainda que é pioneira, em São Paulo, na prática da permanência da doula junto à parturiente e que há 15 anos trabalha com doulas voluntárias na instituição. Atualmente, o hospital diz que tem uma equipe de 40 doulas para acompanhar as gestantes.
Procura, a Secretaria Municipal da Saúde informou vai apurar o caso e que para realizar a penalidade cabível precisa que a paciente denuncie o nome do profissional e os relatos exatos do caso. A prefeitura recomenda que a mãe realize, por meio do telefone 156, ao menos denúncia anônima, para que a secretaria adote as ações cabíveis. “A pasta municipal entende a importância desta profissional em apoio não apenas no momento do parto, como no pré e pós parto e espera de suas unidades próprias e conveniadas, o devido cumprimento da legislação”.
1 comentário
Sou Doula ha 8 anos e me sinto onrada pir este trabalho maravilhoso e humano. Acho que tinha que tet uma conferencia para DOULAS em Belo Horizonte ou em outro estado…mas que dessem condiçoes para que todas fossem. Temos que ser mais valorizadas e reconhecidas em todo o mundo.