“Agora é só uma vez por mês” ou “meu bebê já está com três meses e ainda não transamos” e ainda “entre dormir e transar, prefiro dormir”. Esses são alguns dos relatos da vida sexual das mulheres com filhos pequenos.
Quem é mãe sabe que uma das maiores reclamações da maternagem é a privação de sono. Madrugadas em claro com o pequeno doente ou noites dormindo ‘picadinho’ amamentando são algumas das realidades. Lidar com a falta de uma, ou melhor, várias noites sem dormir direito acaba com o humor – e a libido – de qualquer pessoa que tem que tirar energias de sabe-se Deus onde para cuidar da cria. E como fica a relação marido e mulher nessa história?
Não fica – pelo menos temporariamente. O sexo é uma das últimas coisas que vai passar na cabeça daquela mãe que está mergulhada no universo maternal. “Ela se entrega de corpo e alma para um ser totalmente dependente dela e, apesar de ser uma dedicação prazerosa, é extremamente cansativo e exaustivo”, diz a psicóloga e doula Denise Curti Feliciano, 37, que coordena um grupo de pós-parto.
A retomada da vida sexual é difícil para a mulher, mas também para o homem. Para a mulher tem a questão física de recuperação. Além das intervenções que normalmente são submetidas no parto, como, possíveis lacerações e episiotomia [corte desnecessário feito entre o ânus e a vagina]no parto normal ou a incisão abdominal da cesárea geram desconforto e insegurança para recomeçar a atividade sexual.
“Para o homem, principalmente com a chegada do primeiro filho, a constituição familiar modificou intensamente. A mulher virou mãe e o entendimento do casal como homem e mulher pode necessitar de alguns ajustes que ele está buscando”, diz a fisioterapeuta e professora da Unifesp Míriam Zanetti, 40.
A fisioterapeuta, que é vice presidente da AbraFism (Associação brasileira de Fisioterapia em Saúde da Mulher), diz que a mulher que tem parto normal consegue retomar as atividades do cotidiano, inclusive a vida sexual, mais rapidamente. “Muitos estudos mostram que quando a mulher realiza um parto vaginal, mais próximo do natural possível [principalmente com períneo íntegro], o retorno à vida sexual é muito mais precoce”, ressalta.
Como fisioterapeuta, Míriam conta que recebe muitas reclamações das pacientes por conta do assoalho pélvico. Normalmente, as mulheres se queixam que a musculatura modificou após o parto e o desconforto e dor dos pontos da episiotomia, por exemplo.
Ela explica que independente da via de parto, a musculatura do assoalho pélvico fica sobrecarregada pelo útero gravídico durante os nove meses de gestação. “É mais fácil entender que a musculatura abdominal estará modificada após o parto, pois passou por uma distensão bem intensa e que precisará mais exercícios para que se recupere. Mas, o mesmo ocorre com o assoalho pélvico, que também sofreu sobrecarga e distensão”, diz Míriam, que sugere procurar um especialista para fazer exercícios para fortalecer essa região.
AMAMENTAÇÃO E HORMÔNIOS
Muito se fala do período da quarentena após o parto onde a mulher não deve manter relações independente da via de parto, no entanto, a mulher que amamenta terá dificuldades em transar por um período maior. A fisioterapeuta explica que dois hormônios são altamente produzidos pela mulher com um recém-nascido e que são inibidores do desejo sexual: a prolactina (amamentação) e o cortisol (produzido em situações de estresse e cansaço intenso).
“O seio é uma zona erógena e sensível. Tanto que durante a relação sexual, ele fica muitas vezes intocável. Muitas mulheres relatam que não conseguem imaginar o marido chegando perto e tocando os seios e, se isso acontece, a repulsa é na hora, involuntariamente a mulher se afasta”, diz a psicóloga. Quando estão amamentando, muitas mulheres acabam transando sem tirar sequer o sutiã e o absorvente de seio para evitar vazamentos, por exemplo.
Fora as outras encanações que passam na cabeça dela como aceitar o novo corpo e se sentir atraente novamente. Denise comenta que algumas mulheres têm sim vontade mesmo amamentando. “Ela fica na expectativa para chegar o fim do dia e o bebê enfim dormir, mas assim que ele dorme ela acaba capotando junto”, relata.
Míriam orienta os casais a conversar sobre o que vai mudar, inclusive na vida sexual deles, antes de engravidar. “Por isso é importante no planejamento do casal em ter um filho levar esse período em consideração. O casal precisa entender que realmente será mais difícil no relacionamento de homem-mulher, porém, é necessário para o início de um relacionamento familiar”, afirma.
A fisioterapeuta comenta que muitos pacientes relatam que se sentem rejeitados pela mulher neste período. “A forma como eles lidam com essa dita ’rejeição’ varia de homem para homem. Mas acredito, que se essa situação fosse mais esclarecida, discutida e compreendida antes da gravidez, talvez fosse mais fácil encarar esse período como ‘adaptação’ do que ‘rejeição’”, observa.
TRANSAR SEM VONTADE
Muitas mulheres ainda transam sem vontade apenas para ‘satisfazer’ o parceiro, principalmente, por terem vergonha de conversar a respeito com o seu companheiro.
“Sexualidade normalmente é algo difícil de se discutir, mas a conversa, a comunicação, de forma empática para que o outro não se sinta rejeitado é a melhor alternativa”, aconselha Míriam.
Ela comenta que com a diminuição de libido, a lubrificação vaginal também será reduzida. Uma sugestão que ela faz é aumentar as carícias preliminares. “Muitas vezes a mulher não tem vontade de iniciar uma relação, mas com a adequada estimulação, entra na fase da excitação e desencadeia o reflexo orgásmico. Assim, o casal perceberá que mesmo num período mais difícil, a vida sexual adaptada pode ser plena”, diz.
Uma coisa é certa: a libido vai voltar, mas não há uma regra de quando isso acontecerá. Algumas podem levar um mês e outras mais tempo. “Com certeza dá para ter o mesmo pique da época de namoro. Agora quando e como, só o casal poderá saber”, comenta Míriam.